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Relatório Global 1998
Human Rights Watch/Americas
(Divisão das Américas)
Acontecimentos na área do Direitos Humanos
Na Colômbia, trinta e cinco massacres custaram a vida de 272 indivíduos nos primeiros oitos meses do ano
de 1997. Durante o mesmo período, mais 450 foram assassinados por razões políticas. A maior parte das
chacinas foi atribuída a grupos para-militares que geralmente trabalham com a conivência militar e em alguns
casos com o apoio militar. Segundo a Comissão Colombiana de Juristas (CCJ), organização respeitada de
direitos humanos, 76% das violações aos direitos humanos relatadas em 1997 foram por obra de
para-militares, 17% foram devido às guerrilhas e 7% por agentes do governo. No Peru, a tortura continuou
como prática comum empregada por policiais contra suspeitos terroristas, suspeitos de crimes comuns e,
até mesmo, um membro da inteligência militar acusado de vazar informações para a imprensa. No México, a
violência política nas áreas rurais - em alguns casos com envolvimento ou conivência oficial - continuou a ser
grave. A Justiça demonstrou tendência corporativista com os agentes pró-governo e severidade contra a
oposição. No Brasil, fitas de vídeo amador que captaram incidentes de brutalidade policial chocaram uma
nação aparentemente indiferente ao destino de suspeitos criminosos. Na Venezuela, forças de segurança
recorreram a sistemáticos abusos, incluindo torturas, execuções extrajudiciais e desproporcional uso de
forças letais em seus esforços para controlar o crime nas áreas urbanas.
O governo do presidente Alberto Fujimori, no Peru, demostrou falta de respeito para com o Estado de Direito
ao efetuar uma série de manobras mirabolantes incluindo a cassação de três dos sete membros da Corte
Constitucional depois de que estes se pronunciaram contra um terceiro mandato presidencial de Fujimori. A
remoção efetivamente encerrou a função da Corte no que se refere a resolução de conflitos constitucionais.
As condições carcerárias em diversas partes da América Latina continuaram muito ruins constituindo
violações sérias aos direitos humanos sendo que a grande maioria dos detentos não foi sequer condenada
por crime algum. De fato, alguns detentos ficavam em prisão preventiva, violando o pressuposto da
inocência. Noventa por cento dos presos hondurenhos, paraguaios, uruguaios não foram condenados,
enquanto na República Dominicana, Panamá, Haiti, El Salvador, Peru e Venezuela essa proporção de
detentos aguardando sentença variava entre 65% e 85%. Na República Dominicana, nossos pesquisadores
encontraram um preso que fora mantido em cadeia por dez anos sem ser julgado.
Enquanto isso, um grave retrocesso para os mecanismos internacionais de defesa dos direitos humanos, foi
a decisão da Jamaica anunciada em outubro que seria o primeiro país do mundo a revogar o Protocolo
Facultativo do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (Optional Protocol to the International
Covenant on Civil and Political Rights). A Coréia do Norte renunciou ao próprio Pacto em agosto. A atitude
jamaicana, que deverá ter o efeito impedir que indivíduos cujos direitos venham a ser violados pelo governo
jamaicano de apelar ao Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas, teve como intenção aparente
negar condenados a morte oportunidade de revisão pelas Nações Unidas.
Embora o cenário de 1997 tenha sido marcado por graves violações aos direitos humanos, ocorreram vários
avanços positivos. A assinatura do acordo final de paz na Guatemala, colocando um ponto final em três
décadas de conflitos armados contribuiu para uma contínua diminuição do número de violações aos direitos
humanos vinculados com operações contra-guerrilhas. O governo peruano, em outubro, suspendeu o uso de
"tribunais sem rosto" para suspeitos terroristas. Esses tribunais tinham apresentado inúmeros e graves casos
de violações do direito ao devido processo. Pessoas acusadas de terrorismo com agravantes, chamado de
"traição" no Peru, continuarão a serem julgadas pela Justiça Militar. Não obstante, os juizes não mais serão
mantidos anônimos. A modificação no Código Penal brasileiro tipificando a tortura com crime representou
avanço nos esforços para erradicar essa prática. Na Colômbia, o presidente Ernesto Samper introduziu dois
projetos de lei importantes: o primeiro asseguraria que os processos de violações graves aos direitos
humanos seriam tratados pela Justiça Comum e não pela Justiça Militar; o segundo tipifica o
desaparecimento forçado como crime. Na Venezuela, a Corte Suprema votou, em 14 de outubro, a
inconstitucionalidade da lei de vadiagem, de 1956, que permitia a detenção administrativa de até cinco anos
para possíveis delinqüentes sem qualquer prova da responsabilidade criminal individual.
Talvez o acontecimento mais nefasto em 1997 tenha sido a perseguição, em vários países, à alguns dos
mais destacados repórteres e veículos de imprensa. Autoridades hiper-sensíveis no Panamá, Argentina e
Peru, demonstraram intolerância para com aceitar críticas a elas proferidas pela imprensa, característica
mais comum nos regimes autoritários do que nos democráticos. Em Cuba, o assédio à reduzida imprensa
independente continuou sem trégua.
Na Argentina, em janeiro, o fotógrafo José Luis Cebezas foi algemado, espancado, morto com um tiro fatal e
depois seu corpo incendiado, chamando atenção para os perigos de investigar a corrupção policial. No
momento de elaboração deste texto, três policiais do interior foram detidos em conexão ao crime. Em 11 de
setembro, o único oficial da marinha argentina que voluntariamente confessou uma série de abusos aos
direitos humanos durante o período da ditadura militar, de 1976 a 1983, foi seqüestrado por homens
armados com credenciais de policiais. Durante as duas horas de cativeiro, o ex-capitão Adolfo Scilingo foi
espancado, ameaçado e as iniciais dos jornalistas aos quais ele havia contado sua estória foram cravadas
em seu rosto. Seus agressores ameaçaram matá-lo assim como aos jornalistas em questão: Mariano
Grondona, Magdalena Ruiz Guiñazú e Horacio Verbitsky. A reação do presidente Menem a esse incidente
revoltante, no qual ele sugeriu que Scilingo não deveria ser levado à sério, seguiu comentários infelizes de
pouco antes do ataque, no qual Menem aparentemente sugeria que os limites da liberdade de imprensa
poderiam ser determinados por violência.
O governo de Ernesto Pérez Balladares, no Panamá adotou medidas de repressão contra o direito de livre
expressão ao iniciou processo para deportar o jornalista peruano, Gustavo Gorriti, editor-adjunto do jornal La
Prensa. Os artigos de Gustavo Gorriti abordavam a corrupção dos círculos oficiais incomodando aqueles no
poder. Estes, por sua vez, procuravam formas de expulsar o condecorado repórter baseado em princípios
legais sem fundamento. O grupo de investigação de Gustavo Gorriti reportara sobre fluxos de dinheiro de
tráfego para a campanha do presidente Ernesto Pérez Balladares, alegando também irregularidades na
acumulação de redes de televisão pelo primo do presidente. No entanto, uma vitória significativa para a
liberdade de imprensa, foi a retificação do próprio governo, em outubro, permitindo que o jornal La Prensa
pudesse manter Gustavo Gorriti na sua posição com a promessa do governo panamenho de revogar a
legislação que limita o papel de cidadãos estrangeiros na mídia nacional.
No Peru, o governo lançou campanha contra Baruch Ivcher Bronstein, israelense de nascimento, sócio
majoritário do canal 2 da capital, Lima. O canal 2 foi o primeiro a transmitir uma entrevista com Leonor La
Rosa, um agente da inteligência militar duramente torturado pelos seus superiores por suspeita de ter vazado
informações sobre os planos de perseguição à imprensa. Uma campanha crescente de violências contra
Ivcher culminou na revogação, em 13 de julho, de sua nacionalidade peruana, seguida por apoderação de
sua estação de televisão pela minoria de acionista pró-governo. Outros jornalistas enfrentaram muitos
assédios, incluindo Blanca Rosales, editora-diretora do jornal La República, que foi seqüestrada, espancada
e ameaçada por homens armados não identificados antes de ser solta.
Autoridades cubanas continuaram a intimidar jornalistas. Entre os presos estão Héctor Peraza Linares,
co-diretor da agência de jornalismo Imprensa de Havana e Raúl Rivero, chefe da agência Imprensa Cubana.
Em 26 de fevereiro, um grupo pró-governo reuniu-se na frente das casas das jornalistas cubanas Tania
Quintero e Ana Luisa Baeza, atirando objetos e gritando. Joaquín Torres Alvarez, diretor da Imprensa de
Havana, foi espancado em maio por vários agressores que ele mais tarde identificou como sendo membros
da Segurança do Estado e representantes do partido comunista do seu bairro.
No México, homens armados assassinaram Jesús Bueno León do semanal do estado de Guerrero, 7 Días;
Bueno escrevera sobre sua suspeita que oficiais do estado planejaram matá-lo em retaliação por suas
reportagens. Depois de noticiarem os excessos da polícia na cidade do México em setembro, quatro
repórteres foram capturados e torturados por agressores não identificados.
Em dezembro de 1996, uma nova série de regulamentações para a televisão entraram em vigor na
Colômbia, incluindo limitações na transmissão de imagens violentas, se fossem aplicadas, poderiam
comprometer a abrangência dos noticiários. Entre outras coisas, as medidas restringiam a transmissão de
declarações da guerrilha ou outra organização criminosa. Embora esses medidas não tenham produzido
nenhuma tentativa de censura até o presente momento, sua implementação garantiu ao governo tremendo
poder para limitar as reportagens televisionadas. O câmara colombiano, Ricardo Velez, fugiu do país em
setembro depois de receber sérias ameaças de morte devido a suas denúncias contra o exército. Soldados
tinham espancado Ricardo Velez enquanto ele filmava a repressão à uma passeata de protesto em 1996.
Em junho, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos publicou um relatório determinando que o
governo do Chile havia violado os direitos de liberdade de expressão ao proibir a venda de um livro escrito
por Francisco Martorell em 1993. O livro, Impunidade Diplomática, tratava das circunstâncias que levaram a
partida do embaixador da Argentina no Chile, Oscar Spinosa Melo. A Comissão conclamou o governo do
Chile a retirar a censura ao livro.
Na Venezuela, o presidente, Rafael Caldera, recomendou que uma Cúpula Iberoamericana marcada para
novembro de 1997 sugerisse medidas para proteger o "direito à informação verdadeira". Sua defesa desse
conceito que implica no controle governamental o conteúdo de reportagens provocou a bem merecida crítica
da imprensa e da sociedade civil.
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