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O Brasil atrás das grades

O Trabalho e Outras Atividades
        TRABALHO
        EDUCAÇÃO
        EXERCÍCIO E RECREAÇÃO
        RELIGIÃO

PREFÁCIO

RESUMO

SISTEMA PENITENCIÁRIO

SUPERLOTAÇÃO

DELEGACIAS

CONDIÇÕES FÍSICAS

ASSISTÊNCIA

ABUSOS ENTRE PRESOS

ABUSOS POR POLICIAIS

CONTATO

TRABALHO

DETENTAS

AGRADECIMENTOS

 

O trabalho dos detentos, juntamente com a educação e o treinamento profissional, desempenha um papel significativo na estratégia de reabilitação da LEP. Ao aprender um ofício ou profissão e adquirir bons hábitos de trabalho, um detento pode aumentar muito suas chances de se integrar com sucesso à sociedade após ser solto. Não obstante, apenas uma minoria entre os detentos brasileiros tem a oportunidade de trabalhar. As oportunidades de educação e treinamento são escassas, oferecendo aos detentos poucas válvulas de escape construtivas para suas energias. Em algumas prisões, e especialmente nas delegacias policiais, até mesmo a recreação é limitada. A indolência e o tédio daí resultantes agravam as tensões entre os detentos e entre os detentos e os guardas.

Trabalho

De acordo com a LEP, todos os presos condenados devem trabalhar.(318) É preciso notar, porém, que as obrigações legais com relação ao trabalho prisional são recíprocas: os detentos têm o direito de trabalhar e as autoridades carcerárias devem, portanto, fornecer aos detentos oportunidades de trabalho.(319) Apesar das determinações legais, entretanto, os estabelecimentos penais do país não oferecem oportunidades de trabalho suficientes para todos os presos. Embora a proporção de detentos que se dedicam a alguma forma de trabalho produtivo varie significativamente de prisão para prisão, apenas em algumas prisões femininas encontramos de fato oportunidades de trabalho abundantes. Para citar alguns exemplos representativos entre os estabelecimentos visitados pela Human Rights Watch: cerca de 15% da população carcerária na Penitenciária Raimundo Vidal Pessoa, em Manaus estavam empregados; cerca de 50 a 60% da população carcerária na Penitenciária Estadual de São Paulo estavam empregados; nenhum preso no Presídio de Segurança Máxima de João Pessoa estava empregado; cerca de 30 a 40 % da população carcerária do Penitenciária Regional de Campina Grande tinham emprego; cerca de 15% da população carcerária do Presídio Central de Natal estavam empregados, e cerca de 20% da população carcerária do Presídio Central de Porto Alegre tinham emprego.

A situação é pior ainda nas delegacias policiais. A única oportunidade de trabalho que elas oferecem é serviço de faxina. Apenas poucos detentos em cada carceragem trabalham nesse serviço, geralmente de dois a seis detentos, dependendo do tamanho da delegacia. Todos os outros detentos, condenados ou não, ficam ociosos.

Deve-se ressaltar que o reduzido número de detentos empregados é resultado da escassez de oportunidades de trabalho, e não de falta de interesse da parte dos detentos. Para começar, de acordo com a LEP o trabalho deveria ser obrigatório, e não opcional. Mas ainda mais convincente, na prática, é o incentivo criado pela própria lei para a redução de sentenças. De acordo com esse dispositivo legal, para cada três dias de trabalho, um dia deve ser debitado da sentença do detento. Ansiosos para sair da prisão o mais rápido possível, quase todos os detentos estão dispostos a trabalhar, mesmo sem receber. Na verdade, os detentos reclamaram muitas vezes da falta de oportunidades de trabalho. A escassez de trabalho nas carceragens das delegacias é uma das muitas razões pelas quais os detentos se revoltam para serem transferidos para as prisões.

O tipo de trabalho oferecido aos detentos varia da manutenção, limpeza e reparos - oferecidos na maioria das prisões - ao emprego em companhias particulares, que contratam detentos para produzir itens como pastas, caixas e cadernos. Algumas prisões têm oficinas controladas pela Fundação Nacional Penitenciária - FUNAP, o órgão nacional encarregado de gerir o trabalho prisional. Nessas oficinas, os presos trabalham em serviços de costura e carpintaria.

O salário dos detentos varia consideravelmente de prisão para prisão. A LEP determina que os detentos recebam três quartos do salário mínimo. De acordo com os índices em vigor, essa quantia seria de R$ 97,50 por mês.(320)

A Human Rights Watch encontrou poucas prisões que pagavam aos detentos uma quantia semelhante ou aproximada. Na verdade, algumas prisões não pagavam nada, violando assim as normas internacionais que regulam o trabalho prisional.(321)

Em diversos estabelecimentos penais, incluindo a Casa de Detenção e a Penitenciária Estadual de São Paulo, os detentos trabalham por peça e são pagos de acordo com sua produção. Os detentos que fazem cartões na Casa de Detenção, por exemplo, disseram-nos que recebem entre R$20 e R$25 por mês se trabalharem fazendo hora extra, e cerca de R$15 por mês se cumprirem o horário regular.(322)

Educação

O nível educacional geralmente baixo das pessoas que entram no sistema carcerário reduz seus atrativos para o mercado de trabalho. Isso sugere que programas educacionais podem ser um caminho importante para preparar os detentos para um retorno bem-sucedido à sociedade. Reconhecendo essa possibilidade, a LEP determina que os detentos recebam oportunidades de estudo, garantindo-lhes, em especial, educação escolar primária.(323) A lei também promete aos detentos treinamento vocacional e profissional.(324)

Quanto mais superlotada, barulhenta e perigosa a prisão, é óbvio que menos estímulo à educação ela oferece. Algumas prisões de péssima reputação, tais como o Presídio do Róger, em João Pessoa, não oferecem aos detentos qualquer oportunidade educacional. Em outras prisões apenas uma fração da população carcerária pode estudar. Na Penitenciária Estadual de São Paulo, por exemplo, disseram-nos que por volta de 10 por cento dos detentos - cerca de 200 pessoas - estavam estudando em nível primário, enquanto que cerca de 5 por cento dos detentos da Casa de Detenção de São Paulo estariam estudando em nível primário ou secundário, assim como 8 por cento dos detentos da Penitenciária Raimundo Vidal Pessoa de Manaus. De maneira semelhante ao que acontece com a ausência de oportunidades de emprego, as delegacias policiais não oferecem aos detentos qualquer oportunidade de estudo.

Embora alguns professores sejam trazidos para a prisão especialmente para ensinar, a maioria das aulas é dada pelos próprios detentos, normalmente aqueles que têm maior nível educacional ou apresentam habilidades especiais. Na Penitenciária Raimundo Vidal Pessoa de Manaus, por exemplo, encontramos um detento colombiano que dava aulas de espanhol.

Durante nossas visitas, vimos diversas salas de aula vazias, mas poucas aulas de fato. Na Casa de Detenção, vimos uma aula de datilografia no pavilhão 6; o professor, um detento, disse-nos que cerca de setenta presos recebem aulas de datilografia de uma hora por dia durante seis meses.

Exercício e Recreação

Em uma linguagem um tanto inexata, a LEP determina "proporcionalidade" entre o tempo dedicado pelos detentos ao trabalho e o tempo dedicado ao descanso e à recreação.(325)

É claro que, já que a maioria dos presos passa pouco tempo trabalhando, conseqüentemente tem muito tempo disponível para se exercitar, jogar, relaxar ou dormir. O acesso dos detentos a instalações recreacionais, - em especial, a quadras e campos de futebol ao ar livre, de extensão razoável -, contudo, varia consideravelmente de prisão para prisão.

Algumas prisões têm pátios ou quadras ao ar livre, ao lado dos blocos de celas, e os presos passam o dia inteiro nesses locais. Em outras prisões, detentos de pavilhões ou galerias diferentes são levados para as áreas de recreação em turnos. Na Penitenciária Raimundo Vidal Pessoa, de Manaus, por exemplo, os presos de cada uma das quatro alas dispõem de uma hora e meia de recreação ao ar livre por dia, em um grande campo de futebol. No Presídio Central de Porto Alegre, os presos passam duas horas no pátio todos os dias. Na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas, os detentos ficam trancados em suas celas durante o dia inteiro, exceto pelas quatro horas diárias em que são soltos para se exercitarem no pátio. Esses estabelecimentos penais obedecem as Regras Mínimas, que determinam que os detentos tenham acesso a pelo menos uma hora por dia de exercício ao ar livre.(326)

Mas em muitas outras prisões - ou em certas seções de prisões - os presos têm oportunidades de exercício ao ar livre mais limitadas. Na Penitenciária Central João Chaves, em Natal, por exemplo, os presos podem ficar no pátio apenas duas horas de cada vez, duas vezes por semana. No Presídio de Segurança Máxima de João Pessoa - outro estabelecimento penal no qual os presos passam a maior parte do dia trancados em suas celas - os detentos dispõem de trinta a quarenta e cinco minutos de recreação ao ar livre por dia. Em geral, os presos das celas de isolamento, que por qualquer razão devem ser mantidos separados do resto da população carcerária, dispõem de oportunidades de exercício mais limitadas. Os detentos que vivem nas celas de triagem e na galeria B-3 do Presídio Central de Porto Alegre, por exemplo, recebem duas horas de sol uma vez por semana, e às vezes duas vezes por semana. A principal prisão de Brasília tem uma ala especial para detentos que tenham inimigos em outras áreas da prisão, cerca de quarenta pessoas que nunca podem ir ao pátio para se exercitar, e que saem ao ar livre apenas uma vez por semana.(327)

Essa situação é semelhante à dos presos "amarelos" da Casa de Detenção de São Paulo, que saem ao sol por duas hora uma vez por semana.

O exercício é praticamente impossível nas delegacias policiais. Muitas delas têm pátios vizinhos às celas, onde os presos ficam soltos durante o dia. Se as carceragens tivessem o pequeno número de presos para a qual foram planejadas, então algumas atividades recreacionais seriam possíveis, mas a superlotação eliminou essa opção. Em vez disso, para passar o tempo, os presos escutam rádio, cantam, jogam cartas e conversam. Como um detento nos disse, ressaltando a rotina diária de completa indolência, ele não tem "nada pra fazer o dia inteiro a não ser pensar em fugir".(328)

Tanto nas prisões como nas delegacias, a fuga através da televisão e das drogas é comum entre os presos. De fato, na Casa de Detenção de São Paulo, vimos presos fumando maconha nos corredores de celas. "As drogas fazem o tempo passar", explicou-nos um preso em um outro estabelecimento.(329)

Religião

Em obediência às normas internacionais, a LEP garante aos detentos o direito à liberdade de culto.(330) A maioria dos presos é pelo menos formalmente católica e, como mencionamos anteriormente, a Pastoral Carcerária tem representantes locais em todo o país que visitam prisões de forma regular, celebrando cerimônias religiosas e atendendo às necessidades religiosas dos presos. Denominações religiosas protestantes e afro-brasileiras também são comuns nas prisões. Com freqüência um grupo de presos religiosos de uma determinada denominação -- especialmente evangélicos -- vivem juntos em uma seção especial da prisão.

As prisões maiores freqüentemente têm uma ou mais igrejas. O pavilhão 2 da Casa de Detenção de São Paulo, por exemplo, tem quartos separados para sua igreja católica, um culto afro-brasileiro e duas igrejas protestantes. As delegacias, ao contrário, não têm espaço para a prática religiosa de seus presos.


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