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IV. O PROCESSO DE PAZ DE LUSAKA

Em fins de 1994 a UNITA, que tinha perdido terreno rapidamente, estava ansiosa por assinar um acordo de cessar-fogo. Em contrapartida, o governo estava na mó de cima no campo de batalha, e só assinou o Protocolo de Lusaka depois de muitíssima pressão diplomática. De facto a guerra continuou, embora ambos os lados assinassem por fim o protocolo de cessar-fogo a 20 de Novembro de 1994, em Lusaka. É interessante notar que o líder da UNITA, Jonas Savimbi, se recusou a assinar pessoalmente o acordo, fazendo com que o presidente angolano também o não pudesse fazer, tendo sido os seus subordinados quem endossou o documento, sinal da constante falta de confiança no processo de paz.

Muitos funcionários do governo tinham as suas dúvidas sobre a oportunidade de um cessar-fogo, pois temiam que a UNITA continuasse demasiado forte para a garantia de uma paz duradoura. O Chefe do Estado Maior, General João de Matos, admitia em Fevereiro de 1995 que "apenas a derrota total de Savimbi nos pode assegurar a paz... do ponto de vista estritamente militar, [o Protocolo de Lusaka] foi um erro."1

Segundo o antigo secretário geral da UNITA, Eugénio Manuvakola, que tinha assinado o protocolo em nome da UNITA, também Jonas Savimbi achava que o mesmo tinha sido um erro. Segundo Manuvakola, Savimbi afirmara, em meados de 1994, não querer assumir responsabilidade pelo processo de paz, o qual deveria ser assumida por mais alguém. Os negociadores foram assim Manuvakola, Isaías Samakuva e Jorge Valentim. "Lembro-me de estar a conversar com os meus amigos sobre quem iria ser a cobaia. Não sabia que ia ser eu," declarou Manuvakola depois de ter fugido para Luanda com a família, em Agosto de 1997. Manuvakola revelou também ter sido detido pela UNITA a 14 de Fevereiro de 1995, depois do que permaneceu sob vigia constante da UNITA. Jonas Savimbi tinha ameaçado mandar matá-lo se ele fugisse.2 É óbvio que tinham feito do oficial bode expiatório, por ter assinado o Protocolo de Lusaka.

O Protocolo de Lusaka

Tecnicamente, o protocolo marcava o fim da brutal e dispendiosa "Terceira Guerra" angolana. O Protocolo de Lusaka providenciava um cessar-fogo, a integração dos generais da UNITA nas forças armadas do governo (que se deviam tornar neutras e ser controladas por civis), a desmobilização (mais tarde emendada para desmilitarização) sob vistoria da ONU, a repatriação de mercenários, a integração das tropas da UNITA na Polícia Nacional Angolana, sob controle do Ministério do Interior, e a proibição de qualquer outra polícia ou organização de vigilância.

As principais questões políticas implicadas no Protocolo de Lusaka eram o mandato da ONU (de verificação e monitorização do Protocolo de Lusaka), o papel dos soldados da paz (de supervisão), a conclusão do processo eleitoral, e a reconciliação nacional. Segundo as disposições a reconciliação dos partidos, os líderes da UNITA receberiam residências particulares, escritórios políticos em cada província e um quartel-general. A UNITA preencheria também vários postos, a saber, ministros, vice-ministros, embaixadores, governadores e vice-governadores de província, administradores e administradores adjuntos de município, e administradores de comuna. O MPLA desempenharia todas as outras funções de poder.3 Como pano de fundo do protocolo, estava activo desde 1993 um embargo do Conselho de Segurança sobre as transferências de armas e petróleo para a UNITA, e tanto o governo como a UNITA tinham concordado, como parte do acordo, em interromper novas aquisições de armas. Mas o embargo sobre a UNITA não foi cumprido, e ambos os lados continuaram a fazer abertamente grandes aquisições de armas durante todo o processo.

As questões dos direitos humanos continuavam como texto secundário do acordo, sendo mencionadas apenas indirectamente, nos anexos do protocolo relativos à reconciliação nacional e no mandato da ONU, como princípios gerais de direitos humanos . Em relação à amnistia, a posição tanto do governo angolano como da UNITA era clara: o Protocolo de Lusaka devia estabelecer que "todos os angolanos devem perdoar e esquecer as ofensas que resultaram do conflito angolano, encarando o futuro com tolerância e confiança. Além disso, as instituições competentes amnistiarão... os actos ilegais cometidos por qualquer indivíduo no contexto do presente conflito."4

Uma comissão conjunta, formada por representantes da ONU, do governo e da UNITA, e incluindo observadores dos EUA, Portugal e Rússia (a chamada Troika), orientou a implementação do Protocolo de Lusaka. Qualquer violação do acordo que fosse verificada pela ONU ou participada por um dos partidos seria discutida na Comissão Conjunta. Na prática a comissão tornou-se depositário de registos de violações militares e de direitos humanos, embora a ONU pouca vontade tivesse de investigar ou publicitar estes incidentes. Mesmo quando Isaías Samakuva, chefe da delegação da UNITA à Comissão Conjunta, foi assaltado pelos quadros da UNITA em Maio de 1997, enquanto desempenhava os seus deveres oficiais, a ONU fingiu não ter reparado nesta violação e não fez nenhum esforço para fazer com que os assaltantes respondessem pelo crime, o que acentuou o facto da ONU estar preparada para ignorar as violações dos direitos humanos, mesmo que se tratasse de ataques a oficiais superiores e que houvesse provas fotográficas.

Violações do Protocolo de Lusaka em 1995 e 19965

Fizeram-se muitas violações do Protocolo de Lusaka em 1995 e 1996, com muitas lutas localizadas em que nem sequer o pessoal e agências da ONU foram poupados. Em Março de 1995, guerrilheiros da UNITA abateram um helicóptero da UNAVEM III em Quibaxe. Os líderes militares reuniram-se a 10 de Janeiro de 1995, mas não conseguiram interromper as lutas. Uma segunda reunião, realizada em Fevereiro em Waku Kungo, foi mais bem sucedida no sentido de consolidar o cessar-fogo.

O presidente Eduardo dos Santos e o líder da UNITA, Jonas Savimbi, reuniram-se pela primeira vez desde 1992 em Lusaka, a 6 de Maio de 1995, no que então parecia simbolizar um passo em frente no processo de paz. Os oficiais mais conservadores das forças militares tinham exercido pressão sobre Eduardo dos Santos para que este não comparecesse, mas a ONU e os EUA exerceram também uma contrapressão enorme, convencendo-o do contrário. Tirando partido do contexto criado na cimeira de Maio, entre os dois líderes, em Junho o governo ofereceu a Savimbi a posição de vice-presidente da República de Angola. Mais tarde, no mesmo mês, a UNITA enviou a sua primeira delegação de alto nível a Luanda desde 1992. Em Agosto, após uma segunda cimeira no Gabão, Savimbi acusou recepção da oferta, em nome da UNITA, recusando-se no entanto a dizer se a aceitava. Teve lugar em Bruxelas, em Setembro de 1995, terceira reunião entre os líderes, numa Mesa Redonda entre doadores da UNDP, durante a qual os dois líderes reiteraram a sua dedicação à paz e reconstrução. Em Março de 96 ocorreu em Libreville, no Gabão, nova reunião entre os líderes, durante a qual se acordou um novo calendário revisto para o processo de paz. Nesta reunião o governo ofereceu de novo formalmente uma das duas vice-presidências à UNITA, uma oferta a que o líder da UNITA, Jonas Savimbi, prometeu responder por escrito. Em Agosto de 1996, durante o Terceiro Congresso da UNITA, Savimbi rejeitou formalmente e por escrito a oferta, alegando que o seu partido não desejava que ele assumisse o posto.

Em Setembro de 1995 quase rebentou a guerra aberta na Lunda Norte e Lunda Sul, depois das Forças Armadas Angolanas (FAA) passarem três meses a acumular tropas e material de guerra. A pressão diplomática que a ONU e os EUA exerceram sobre dos Santos foi mais uma vez bem sucedida, resultando na suspensão da operação.

Embora o Protocolo de Lusaka exigisse a "repatriação de todos os mercenários", a firma sul-africana Executive Outcomes (EO) continuava a ter entre 400-500 homens em Angola, estando quase todos contratados pelas Forças Armadas Angolanas. Esta questão tornou-se contenciosa até que por fim o governo angolano, sob pressão dos EUA e outros, disse ao EO que se retirasse, em Janeiro de 1996. Uma percentagem deste pessoal voltou a ser destacada para companhias ligadas ao EO, tais como Branch Mining, Shibata Security, Stuart Mills Associates e outras firmas particulares de segurança tais como Alpha 8, nas áreas de diamantes.6

A maioria dos incidentes em 96 constou de ataques em pequena escala, emboscadas e pilhagens. Em muitas áreas as tropas do governo e da UNITA continuavam próximas uma da outra, e as suas patrulhas agressivas debilitavam as tentativas de aumentar a confiança entre elas. Em Dezembro de 1996 o governo tomou também posse de uma série de aldeamentos controlados pela UNITA a noroeste do país. Mas havia esperança de que, à medida que a confiança fosse aumentando, declinaria o número de violações do cessar-fogo.

Um Número Cada Vez Maior de Violações em 19977

Em 1997 aumentou o número das violações graves do cessar-fogo. Na primeira parte do ano, a maioria das violações do cessar-fogo registadas foram ataques à população civil, concebidos ou para controlar o movimento do auxílio em produtos alimentares em áreas contestadas, ou para impedir que as pessoas se mudassem para áreas controladas pelo outro lado. Deram-se também algumas violações do cessar-fogo de Lusaka quando as forças militares do governo tomaram certas posições avançadas.8

Entre Junho e Setembro de 1997 houve muitos mais registos de mobilização de tropas, movimento de equipamento militar e recrutamentos forçados. A ONU verificou vários ataques lançados pela UNITA contra posições do governo, incluindo na província de Lunda Norte, assim como ataques feitos por forças do governo a aldeias na província de Huíla. Os ataques mais graves foram feitos pela UNITA na Lunda Norte, no Posto de Fronteira Nordeste, a 2 de Julho, altura em que as forças da UNITA arrasaram uma aldeia de cerca de 150 habitantes. A 24 de Julho, no Posto de Fronteira Muaquesse, tropas da UNITA atacaram uma aldeia, queimando casas e matando vários civis. A UNITA fez também várias modificações no calendário de desmobilização das suas tropas à última hora, reactivando-as e destacando-as para locais estratégicos que controlava, tais como Dambi, perto de Uíge, e Vinte Cinco, perto de Huambo.

Em Março de 1997, os pontos principais da violação foram nas províncias nortenhas de Lunda Norte, Lunda Sul, Uíge e Zaire. Houve também grandes problemas nas províncias de Huíla e Benguela. Desde Fevereiro que as FAA vinham concentrando mais as suas tropas na periferia dos territórios da UNITA, aumentando em Maio as incursões para dentro de territórios disputados com a UNITA em Huíla e nas Lundas. Em Setembro já a situação militar se caracterizava por tensões persistentes que afectavam quase todo o país, em especial as províncias de Lunda Norte, Lunda Sul e Malanje. As lutas mais ferozes travaram-se em Junho, altura em que, no decorrer de uma quinzena, as FAA conquistaram cerca de 10 a 15 por cento das áreas produtoras de diamantes controladas pela UNITA, numa operação que expandiu o controle do governo ao longo de um corredor que ia de Dundo a Luena. A maior parte das lutas localizava-se nas Lundas, mas atacaram-se também posições da UNITA no Bié, e mais tarde em Soyo (província de Zaire) e Huíla.

A partir de Julho de 1997 a presidência angolana começou a apelar a uma pausa militar, enquanto negociava arduamente, a nível internacional, para que a ONU decretasse sanções contra a UNITA.9 Em Agosto o Conselho de Segurança ameaçou introduzir mais uma série de sanções à UNITA a não ser que esta cumprisse os compromissos que tinha assumido mas ainda não cumprido, segundo o Protocolo de Lusaka, tais como passar o controle do seu território para o governo, e desmilitarizar-se completamente. A série de sanções adicionais que a ONU tinha ameaçado impor incluíam congelar as contas bancárias da UNITA, bloquear as viagens dos oficiais da UNITA ao estrangeiro e fechar os escritórios da UNITA no estrangeiro.10

A 29 de Setembro o Conselho de Segurança concordou unanimemente em adiar por um mês a implementação das sanções, até 30 de Outubro.11 Devido ao facto da UNITA não ter feito mais nenhum progresso no cumprimento das suas obrigações relativas ao Protocolo de Lusaka durante o mês de Outubro, a 29 de Outubro o Conselho de Segurança adoptou unanimemente a Resolução 1135, a qual impunha uma nova série de sanções, a saber, o bloqueio das viagens dos oficiais da UNITA ao estrangeiro e o encerramento de todos os escritórios do partido no estrangeiro a partir de 30 de Outubro às 00.01 horas EST.12

Três semanas depois de serem impostas as sanções, a UNITA cortou quase todos os seus contactos com o governo e com a ONU. Durante o mês de Novembro e inícios de Dezembro as tensões persistiam, especialmente no Cuango e Lucapa (província de Lunda Norte), assim como nas províncias de Kuito, Huíla e Malanje, como resultado das actividades de bandidos e movimentos ilegais das tropas. A liberdade de movimento das pessoas e mercadorias continuava a ser dificultada por barreiras nas estradas, instaladas tanto pelo governo como pela UNITA. A 28 de Novembro, tropas do governo conquistaram uma série de pequenas áreas produtoras de diamantes, que tinham estado sob controle da UNITA. As tensões tinham porém acalmado em Janeiro de 98, embora continuasse a haver fricções entre as autoridades locais e a UNITA, especialmente nas províncias de Malanje e Uíge. Barreiras nas estradas, instaladas tanto pelo governo como pela UNITA , continuavam a impedir o livre movimento das pessoas e mercadorias.

O Governo de Unidade Nacional

Em Março de 97 o Secretário Geral da ONU, Kofi Annan, foi a Angola, a princípio porque esperava estar presente na tomada de posse do novo governo de unidade nacional, entretanto novamente adiada Num esforço para ultrapassar o impasse, Kofi Annan foi ao Bailundo a 24 de Março, para se reunir com o líder da UNITA, Jonas Savimbi. A visita de Kofi Annan a Angola não teve resultados imediatos, embora tivesse voltado a chamar à atenção para uma série de questões, tais como a situação de Jonas Savimbi, a chegada de oficiais da UNITA a Luanda e a inauguração de um Governo de Unidade e Reconciliação Nacional (GURN).

A 9 de Abril de 1997 a Assembleia Nacional de Angola deu um grande passo em frente com a nomeação de cerca de sessenta e três deputados da UNITA. Cinco deputados da UNITA, que tinham estado a participar na Assembleia Nacional desde 92, tinham anteriormente sido denunciados por Savimbi. Desde então têm tido lugar calorosos debates na Assembleia Nacional, pela primeira vez desde 1992, embora os votos tenham concordado claramente com as linhas políticas dos partidos. O novo Governo de Unidade e Reconciliação Nacional (GURN) tomou posse a 11 de Abril. O líder da UNITA, Jonas Savimbi, não esteve presente à cerimónia, o que acentuou a sua ambivalência em relação ao governo, que incluía representantes da MPLA, UNITA e PDA (Partido Democrático de Angola).

A data inicialmente marcada para a formação deste governo tinha sido Janeiro de 1997, mas não foi possível cumprir este de prazo devido a falhas técnicas nas negociações. As questões principais eram a qualidade e quantidade das residências para os oficiais da UNITA e as dimensões aceitáveis das suas forças de segurança política. Marcou-se novo de prazo para fins de Fevereiro, que também não foi cumprido desta vez porque não se tinha resolvido qual seria a posição de Jonas Savimbi - uma questão que se manteve à cabeça das negociações, visto a UNITA desejar um posto de autoridade militar directa. Em Dezembro de 1996 a ONU tinha tentado separar a questão da situação de Savimbi da formação de um governo de unidade nacional.

O último prazo foi marcado para Março de 1997, o que deu ao Conselho de Segurança da ONU um pouco mais de tempo para pressionar a UNITA no sentido de cumprir o calendário. Era evidente que a ONU estava ansiosa por tornar o governo de unidade nacional efectivo antes que o mandato da organização expirasse, em fins de Julho, indicando a retirada das suas forças militares, a processar-se por etapas. Em Abril alguns elementos da UNITA juntaram-se finalmente ao governo de unidade nacional, talvez devido à pressão internacional e a uma mudança de governo no Zaire (agora a República Democrática do Congo). As eleições parlamentares, marcadas para 1996, foram adiadas por dois a quatro anos, segundo os termos do Protocolo de Lusaka, e não haveria eleições presidenciais até a ONU decidir que as condições eram adequadas.13

Administração Estatal

Também a passagem do controle dos municípios locais para o governo se fez lentamente, começando a 30 de Abril de 1997. Porém em Maio, quando lhe perguntaram qual a razão do atraso da passagem de quinze municipalidades da província de Benguela, a UNITA alegou estar a ter "dificuldades técnicas". Depois da ONU e da Troika (Rússia, Portugal e EUA) terem pressionado a UNITA, a ONU anunciou que a expansão da administração estatal recomeçaria a 26 de Maio, e Vila Nova, a leste e nas proximidades de Huambo, tinha sido transferida a 28 de Maio para uma delegação de alto nível. Alguns dias mais tarde, no distrito de Quibala, Cuanza Sul, alguns partidários da UNITA, manifestando-se contra a transferência dos territórios para o governo, conseguiram assaltar e ferir Isaías Samakuva, chefe da delegação da UNITA na Comissão Conjunta, assim como N'zau Puna, desertor da UNITA, que passara a vice-ministro do Ministério do Interior.14 Durante o resto de 97 a normalização da administração estatal nas áreas controladas pela UNITA progrediu a um ritmo muito lento e irregular. O processo foi de novo suspenso a 1 de Novembro, e retomado a 22 de Novembro. A 8 de Janeiro de 98 tinha-se estabelecido a autoridade do governo central em 239 das 344 localidades originalmente incluídas no plano de paz. A administração estatal tinha sido ampliada para três áreas estratégicas: Cuango, Mavinga e Negage. A 1 de Maio havia ainda cerca de sessenta localidades nas quais não se tinha ainda estabelecido a autoridade central, incluindo os territórios de Andulo, Bailundo, Nharea e Mongo, que estavam sob controle da UNITA.

Apesar da ONU ter apelado várias vezes à UNITA para que transferisse o controle destas quatro localidades para o governo, esta continuava a atrasar-se, apresentando repetidamente novas desculpas. Por fim, a 1 de Julho, os rebeldes foram alvo de novas sanções, tendo sido congeladas as suas contas bancárias, proibidas as suas exportações de diamantes, assim como todos os transportes aéreos e marítimos de e para os territórios sob o seu controle. Já a 6 de Junho Jonas Savimbi tinha dito aos seus partidários em Bailundo, território sob o seu controle nas montanhas centrais, que a UNITA considerava as sanções da ONU como sendo um ataque que tinha como alvo a própria UNITA e ao qual "estava pronta a reagir". Segundo o governo, os rebeldes da UNITA já tinham entrado em acção, tendo capturado, desde Março, cinquenta e cinco localidades em todo o país.

Em Dezembro de 1997 Savimbi e dos Santos tiveram uma conversa telefónica pela primeira vez em muitos meses. Em seguida, a 9 de Janeiro de 1998, chegou-se a um acordo no sentido de acabar de implementar os elementos principais do Protocolo de Lusaka ainda pendentes.15 O acordo previa:

i)Terminar a desmobilização das forças residuais da UNITA, incluindo a retirada dos seus generais.

Prazo: 28 de Janeiro de 1998

Responsabilidade: UNITA/governo

ii) Determinar o número de componentes do corpo da escolta pessoal do presidente da UNITA..

Prazo: 21 de Janeiro de 1998

Responsabilidade: UNITA/governo

iii) Formular uma declaração relativa à desmilitarização da UNITA.

Prazo: 31 de Janeiro de 1998

Responsabilidade: UNITA

iv) Concluir a legalização da UNITA.

Prazo: 4 de Fevereiro de 1998

Responsabilidade: governo

v) Promulgação da situação especial do presidente da UNITA.

Prazo: 9 de Fevereiro de 1998

Responsabilidade: governo

vi) Concluir a extensão da administração do estado.

Prazo: 27 de Janeiro de 1998

Responsabilidade: governo/UNITA/MONUA

vii) Nomear os governadores, vice-governadores e embaixadores designados pela UNITA.

Prazo: 6 de Fevereiro de 1998

Responsabilidade: governo

viii) Desarmamento da população civil.

Prazo: tarefa contínua a partir de 2 de Fevereiro de 1998

Responsabilidade: governo

ix) Estabelecer a direcção da UNITA em Luanda e a extensão da administração estatal para Andulo e Bailundo.

Prazo: 28 de Fevereiro de 1998

Responsabilidade: UNITA/governo/MONUA

x) Conclusão das transmissões da rádio Vorgan, da UNITA.

Prazo: aberto

Responsabilidade: UNITA

Tal como no caso de tantos eventos do processo de paz em Angola, o acordo atrasava-se. Porém, em fins de Janeiro de 1998 chegou-se ao acordo de que a escolta pessoal de Savimbi devia começar por ter 400 elementos, reduzindo-se gradualmente para 150. Marcou-se uma cimeira entre Savimbi e dos Santos, a qual seria a sua primeira reunião cara a cara desde 95. Seria essa também a primeira visita de Savimbi a Luanda desde Setembro de 92. Mas esta visita nunca teve lugar e, em Julho, muitos dos oficiais superiores da UNITA partiram de Luanda para o quartel-general da UNITA, no Bailundo, regressando apenas em fins de Agosto. O período de fins de 97 a meados de 98 foi também caracterizado pela ausência do Representante Especial, Blondin Beye, que andava a tratar uma doença de coração. A sua ausência contribuiu para o aumento da intransigência em ambos os lados.

A data marcada para conclusão do processo geral de paz, assim como para o desenvolvimento de um governo de unidade nacional, para a desmobilização da UNITA e para a completa restauração da administração estatal em todo o território angolano era 28 de Fevereiro de 1998. Nessa data, porém, ainda a UNITA não tinha cumprido as suas obrigações, marcando-se portanto novo prazo para 16 de Março, data esta em que se instalaria a direcção da UNITA em Luanda. Quando a UNITA declarou, a 6 de Março, que tinha desmilitarizado todas as suas forças, o governo reagiu legalizando a UNITA como partido político e nomeando três governadores e sete vice-governadores designados pela UNITA. Ambos os lados concordaram com uma lista de seis embaixadores nomeados pela UNITA. A 31 de Março foi promulgada uma lei concedendo a Savimbi a posição especial de líder do maior partido da oposição.

A 1 de Abril a Rádio Vorgan, estação de rádio da UNITA, deixou de transmitir. No mesmo dia uma delegação da UNITA, chefiada pelo seu Vice-Presidente, General Sebastião Dembo, chegou a Luanda a fim de fazer preparativos para a reabertura dos escritórios da UNITA, a 1 de Junho. A 8 de Abril chegou-se ao acordo de que a redução do destacamento das forças de segurança de Savimbi, de 400 para 150 guardas, duraria 9 meses, e de que sessenta e cinco desses 150 guardas se estabeleceriam em Luanda. A Polícia Nacional Angolana anunciou também que ia formar um destacamento de segurança com 400 elementos.

A um de Abril caducou o prazo estipulado para regresso à administração estatal, , estando apenas 80 por cento das 335 localidades sob controle do governo. Oito das doze áreas estratégicas que deviam ter passado para o governo foram normalizadas em princípios de Junho. As áreas principais ainda pendentes, nomeadamente Andulo, Bailundo, Nharea e Mongo, no centro do país, continuavam a ser foco de negociações. Em Maio de 1998 o Representante Especial da ONU, Blondin Beye, apresentou um novo calendário, apelando à devolução, por parte dos antigos rebeldes das áreas sob o seu controle até 31 de Maio. Estes não o fizeram, e a UNITA requeria mais tempo. A 31 de Maio a ONU anunciou que a UNITA tinha proposto devolver as últimas quatro localidades até 25 de Junho, e que os preparativos técnicos para a transferência deviam terminar entre 17 e 21 de Junho.

A morte do Representante Especial da ONU, Blondin Beye, num desastre de avião da Costa do Marfim, a 27 de Junho, debilitou o trabalho de mediação da ONU. Beye, que foi substituído por Issa Diallo, da Guiné, tinha estado a viajar pelos estados africanos da Costa do Marfim, Togo e Burkina Faso, a fim de pedir aos seus governos que parassem de suportar a UNITA. Após a morte de Beye aumentou a insegurança e a UNITA restabeleceu a sua posição em várias áreas, incluindo Luau, Lumbala, Nguimbo e Cazombo, na província de Moxico.

A UNITA procurou mais uma vez adiar a transferência das quatro localidades estratégicas, e a ONU concedeu-lhe mais dez dias. Todavia a 1 de Julho, quando a UNITA voltou a pedir pelo menos mais duas semanas para se retirar, a ONU perdeu a paciência e impôs nova série de sanções à UNITA, a fim de tentar forçar o seu acordo. Estas sanções parecem ter tido mais impacto como declaração moral do que como meio de obrigar a mudar um comportamento básico . A UNITA continuou firmemente entrincheirada nestas quatro localidades.

Aumento da Tensão

Antecipando o aumento das sanções, a UNITA retirou-se por dois meses da Comissão Conjunta presidida pela ONU, em protesto; afirmando, ao regressar à mesma em Agosto, que permitiria a extensão da administração estatal por altura de 15 de Outubro. O governo contrapropôs a data de 31 de Agosto como prazo limite e, nessa data, suspendeu a UNITA do governo de unidade nacional, por esta não ter assumido aos seus compromissos segundo o Protocolo de Lusaka.

Reagindo a esta situação, Jorge Valentim e outros membros da UNITA que tinham servido no governo anunciaram a sua separação de Savimbi, criando um outro partido chamado o Comité de Renovação da UNITA. O governo declarou que negociaria apenas com esta "nova" UNITA, pedindo aos outros que fizessem o mesmo. Embora a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) tivesse chamado a Jonas Savimbi criminoso de guerra, tendo dado o seu apoio à "nova" UNITA, este grupo não atraiu muito apoio nem em Angola nem fora da SADC. Muitos dos setenta membros do parlamento que pertenciam à UNITA se dissociarem do grupo (estando outros treze fora de Luanda e dois doentes) e muitos outros oficiais superiores da UNITA se recusaram a apoiar o grupo separatista, apesar de terem sido forçados pelas ameaças e subornos do governo. A 2 de Setembro a polícia cercou e tomou controle do quartel-general da UNITA em Luanda, permitindo entrada no edifício apenas aos partidários da facção de Valentim. Oficiais superiores da polícia declararam publicamente que qualquer indivíduo que não fizesse parte do grupo de Valentim era um "criminoso político".

O governo suspendeu também os quatro ministros e sete vice-ministros que a UNITA tinha nomeado a 1 de Setembro para servirem no Governo de Unidade e Reconciliação Nacional. A suspensão foi retirada a 23 de Setembro, mas o presidente despediu um dos ministros e um dos vice-ministros da UNITA no mesmo dia. A 26 de Setembro, cinquenta e três deputados da UNITA assinaram uma declaração procurando obter uma explicação sobre a decisão de suspender os ministros, reafirmando que os setenta membros constituíam o grupo parlamentar da UNITA, sob a direcção de Abel Chivukuvuku. Numa declaração à imprensa, Chivukuvuku afirmou ter cortado todos os seus contactos com Jonas Savimbi, embora acrescentasse não tencionar juntar-se ao Comité de Renovação da UNITA.

A 2 de Outubro alguém disparou sobre a viatura de Chivukuvuku em frente à sua residência em Luanda, no que parece ter sido um ataque premeditado. A esposa e guarda pessoal de Chivukuvuku encontravam-se no carro, mas não foram feridos. Segundo a ONU, o Comité de Renovação tinha pedido às autoridades que retirassem o pessoal de segurança das residências dos deputados da UNITA que não apoiavam o Comité de Renovação.16

O Comité de Renovação da UNITA teve a sua conferência geral em meados de Outubro, em Luanda, anunciando durante a mesma a formação de um Comité Político Provisório para gestão do partido. Decidiu-se também, na conferência, reter todos os deputados da UNITA na Assembleia Nacional, revogando uma decisão anterior de suspender quinze dos setenta deputados.

A 27 de Outubro, segundo decisão adoptada por 115 votos a favor, nenhum contra e sessenta e uma abstenções, a Assembleia Nacional revogou a lei que concedia a Jonas Savimbi uma posição especial como líder do maior partido da oposição. Atribuiu-se a decisão ao facto de Savimbi não ter cumprido as obrigações do seu partido, conforme determinadas no protocolo. Durante este período a situação era precária do ponto de vista da segurança, especialmente nas regiões norte e nordeste, onde as forças do governo e da UNITA continuavam a conduzir operações militares.17

O Retorno à Guerra

O MPLA realizou o seu 4.º Congresso em Luanda, de 5 a 10 de Dezembro. Na sessão de abertura o Presidente dos Santos declarou que o único caminho para uma paz duradoura era o isolamento completo de Jonas Savimbi e do seu movimento. O presidente apelou à cessação do mandato da MONUA, à conclusão do processo de paz de Lusaka. A 6 de Dezembro, como medida de segurança, a MONUA retirou-se de todas as áreas controladas pela UNITA.18

Imediatamente antes da abertura do congresso o governo lançara uma ofensiva militar no centro de Angola, com ataques aéreos ao Bailundo e ao Mungo, seguindo-se ataques ao Andulo. Subsequentemente, as forças da UNITA lançaram os seus próprios ataques, infligindo grandes baixas às forças do governo à população civil. Nos sectores de Huambo e Kuito o governo foi obrigado a recuar, não sofrendo mais perdas no Kuito apenas porque as unidades mecanizadas da UNITA tinham gasto todo o seu combustível. As hostilidades aumentaram e espalharam-se, colocando-se mais minas e a artilharia de longo alcance da UNITA bombardeou indiscriminadamente a Malanje, o Kuito e o Huambo.

A 26 de Dezembro e 2 de Janeiro de 1999 dois aviões da ONU foram abatidos perto do Huambo, resultando na morte de quinze passageiros e oito membros da tripulação respectivamente. Ambos os aviões, que tinham sido alugados pela MONUA, caíram em áreas de operações militares activas. Ambos os partidos angolanos negaram qualquer responsabilidade pelos incidentes, e não se mostraram inicialmente interessados em colaborar com as operações de busca e auxílio.19 As investigações que a ONU fez dos destroços de ambos os aviões concluíram que os mesmos tinham sido ilegalmente modificados, e que os indivíduos em questão tinham tentado dissimular o facto; os registos do voo tinham sido retirados.

A 27 de Janeiro a Assembleia Nacional aprovou uma resolução declarando Jonas Savimbi um "criminoso de guerra e terrorista internacional". A assembleia apelou à instauração de procedimentos jurídicos conducentes à incriminação de Jonas Savimbi e dos seus colaboradores directos que, considerados responsáveis, seriam submetidos às leis criminal e civil, tanto a nível nacional como internacionalmente.

A 29 de Janeiro o Presidente dos Santos nomeou novo gabinete e assumiu temporariamente as funções de primeiro-ministro e comandante-chefe da FAA. Na cerimónia de tomada de posse do novo governo, o presidente declarou que Angola tinha de fazer uma guerra para alcançar a paz.20

A 26 de Janeiro a UNITA ocupou a capital provincial de Mbanza Congo, no norte, embora pareça que as forças do governo a tenham retomado a 12 de Fevereiro. A 30 de Janeiro a UNITA capturou o projecto hidroeléctrico de Capenda, cerca de 50 quilómetros a sudoeste de Malanje. Depois de alguns sucessos iniciais, o governo não conseguiu capturar o Bailundo, tendo a sua ofensiva sido interrompida pela UNITA em princípios de Março; como resultado os rebeldes sofreram uma perda significativa de equipamento, tendo registado também 1000 mortos.21 Enquanto trabalhamos neste livro, as lutas continuam no centro e norte de Angola, e o governo prepara-se actualmente para lançar terceira ofensiva: a Operação Restauração. Em fins de Setembro o governo angolano lançou a sua terceira ofensiva. Passado um mês, a 20 de Outubro, o governo anunciou ter tomado Andulo e Bailundo, duas cidades importantes para a UNITA. A 22 de Outubro o chefe das forças armadas angolanas, General João de Matos, ordenou às tropas do governo que "continuassem a lutar até à liquidação total" dos rebeldes de Jonas Savimbi.22

Em Junho a ICRC noticiou que, em redor do Huambo, "encontros violentos, com inúmeros ataques e contra-ataques, tinham deixado a população civil extremamente insegura, tendo aumentado os números de deslocados. Certas cidades das redondezas, tais como Gove, Sambo e Cuíma encontram-se completamente abandonadas - um novo fenómeno regional."23

Os efeitos do conflito resultaram num número mais elevado de indivíduos deslocados. Segundo a ONU, o número de deslocados internos atingiu mais de um milhão, 10 por cento da população total, havendo fluxos adicionais de refugiados na República Democrática do Congo, na Namíbia e na Zâmbia.

A 24 de Julho as autoridades angolanas emitiram um mandato de captura em nome do líder da UNITA, Jonas Savimbi, acusando-o de vários crimes, incluindo rebeldia, sabotagem, homicídio e tortura. O mandato acusa também Savimbi de rapto, roubo, e utilização de explosivos - incluindo a colocação de minas terrestres em locais utilizados por civis. O Secretário Geral da ONU, Kofi Annan, criticou este mandato, dizendo que estava "errado" e que se "devem fazer as pazes com o inimigo, e que, para fazer as pazes, é preciso haver comunicação, ou directa ou através de terceiros."24

Aventuras Regionais: Criação de um Cordon-Sanitaire em Redor da UNITA

Como corolário da falta de confiança sentida em Angola, o governo angolano trabalhou no sentido de construir um cordon-sanitaire regional, para dificultar as tentativas que a UNITA fazia para violar as sanções. Esta situação resultou nos compromissos militares de Angola no Congo-Brazzaville e na República Democrática do Congo, e numa série de ameaças de acção militar contra a Zâmbia.

Durante a Guerra Fria o Zaire e seu presidente, Mobutu, tinham sido clientes importantes dos EUA, fornecendo facilidades de apoio à UNITA e separatistas de Cabinda em fins da década de 80 e princípios da de 90. Após o fim da Guerra Fria o Zaire continuou a apoiar a UNITA, derivando grandes lucros actividades que violavam das sanções impostas à UNITA, as quais envolviam linhas de fornecimento de armamentos e equipamento, assim como uma rota de comércio de diamantes para Antuérpia e outros locais.

A guerra civil que rebentou em 1997 no Zaire tornou-se em parte uma extensão do conflito angolano. Até Março de 97 a UNITA lutou do lado das forças do governo, a favor de Mobutu, contra dois batalhões de angolanos Katangeses (provenientes da província de Shaba, no Zaire). Estes batalhões tinham sido enviados pelo governo angolano para ajudar o líder dos rebeldes, Laurent Kabila. Quando Kinshasa foi conquistada pelos rebeldes e o Zaire se tornou a República Democrática do Congo, a UNITA perdeu as suas linhas de abastecimento e começou a poder esconder muito menos tropas no lado de lá da fronteira. Em Dezembro de 97 as forças de segurança de Kabila capturaram os membros principais de todas as facções separatistas de Cabinda que residiam em Kinshasa. Embora tenham sido postos em liberdade em Fevereiro de 98, estes indivíduos são agora bem vigiados.

As relações entre Laurent Kabila e Luanda continuam fortes, embora tenham tido as suas dificuldades em 1998. Em Agosto de 98 Luanda voltou a envolver-se na República Democrática do Congo com tropas, tanques e apoio aéreo para o presidente Kabila, no novo conflito que se desenvolveu no Congo. Mas, em fins de Fevereiro de 99, quase todas estas tropas tinham regressado a Angola devido à renovação da guerra com os rebeldes da UNITA. O acordo de paz de Julho de 1999 da República Democrática do Congo inclui menção de ser necessário desarmar, entre outros grupos, os combatentes da UNITA.

Com a queda de Kinshasa, o foco mudou para a outra banda do rio Congo: Congo-Brazzaville. O presidente Pascal Lissouba permitiu que a UNITA usasse Brazzaville e Pointe Noire para operações de violação das sanções. Os soldados da UNITA lutaram do lado de Lissouba na guerra civil que se tinha iniciado entre ele e o seu rival, o antigo ditador militar Denis Sassou-Nguesso. Passados três meses de guerra, vários milhares de militares angolanos passaram de Cabinda para o Congo-Brazzaville, em apoio de Sassou-Nguesso. A 15 de Outubro de 1997 Pascal Lissouba, o presidente eleito, era deposto e o líder militar Denis Sassou-Nguesso regressava ao poder. Morreram pelo menos 10 mil pessoas neste conflito, e as tropas angolanas entraram então rapidamente em acção contra a UNITA e forças separatistas de Cabinda. Em Maio de 99 várias centenas de militares angolanos assentaram no Congo-Brazzaville.

Outra manobra do governo angolano no sentido de isolar e cercar a UNITA foi o facto de ter organizado no país uma cimeira a 27 de Outubro, durante a qual o novo presidente do Congo-Brazzaville Denis Sassou Nguesso, que se tinha nomeado a si próprio, assim como os presidentes Omar Bongo, do Gabão, e Laurent-Desire Kabila, da República Democrática do Congo, assinaram um pacto regional de segurança. A 8 de Abril Angola, a Namíbia, o Zimbabwe e a República Democrática do Congo assinaram em Luanda um pacto geral de defesa. Depois de este acordo a imprensa tem relatado casos de destacamento de tropas namibianas e zimbabweanas no norte de Angola, mas estes relatórios não foram verificados de forma independente e os governos da Namíbia e do Zimbabwe negaram ter enviado tropas para Angola.25

A atenção de Luanda passou então para a Zâmbia, onde fora noticiado que uma série de funcionários superiores do governo estavam a ajudar a UNITA a violar as sanções. As relações bilaterais não são boas e o governo de Lusaka tem culpado Angola do seu envolvimento na tentativa abortada de golpe de estado levada a cabo por jovens oficiais a 28 de Outubro de 1997. Alguns oficiais zambianos admitiram em privado terem medo que Luanda interferisse na Zâmbia tal como o tinha feito no Congo-Brazzaville. Embora o governo zambiano tenha reduzido as actividades de transgressão das sanções, em 1998 e 1999 parece ter continuado a haver certo movimento entre a Zâmbia e as áreas da UNITA, para benefício desta última.

1 Le Monde, (Paris), 16 de Fevereiro de 1995.

2 "Conferência de Imprensa por Eugénio Manuvakola, Antigo Secretário-Geral da UNITA, sobre a sua fuga da UNITA," transcrição publicada em Jornal de Angola, (Luanda), 28 de Agosto de 1997.

3 Protocolo de Lusaka (Amsterdão: AWEPA/ African-European Institute, 1996).

4 Protocolo de Lusaka, Anexo 6, Ponto II.4 da Agenda de Trabalhos à Reconciliação Nacional, Princípios Gerais 1.5 (Amsterdão: AWEPA/ African-European Institute, 1996).

5 Human Rights Watch Arms Project e Human Rights Watch/Africa, "Angola: Between War and Peace; Arms Trade and Human Rights Abuses since the Lusaka Protocol," A Human Rights Watch Report, Fevereiro de 1996, vol.8, n.º1 (A).

6 Alex Vines, "Mercenaries and the Privatisation of Security in Africa," em Greg Mills and John Stremlau (eds.), The Privatisation of Security in Africa (Joanesburgo: South African Institute of International Affairs, 1999) pp.47-80.

7 Human Rights Watch, Human Rights Watch World Report 1998 (Nova Iorque: Human Rights Watch, 1997).

8 Ibid.

9 Paul Hare, Angola's Last Best Chance for Peace: An Insider's Account of the Peace Process (Washington DC: U.S. Institute of Peace Press, 1998).

10 ONU, Resolução n.º 1127 do Conselho de Segurança (1997) de 28 de Agosto de 1997.

11 ONU, Resolução n.º 1130 do Conselho de Segurança (1997) de 29 de Setembro de 1997.

12 ONU, Resolução n.º 1135 do Conselho de Segurança (1997) de 29 de Outubro de 1997.

13 Norrie MacQueen, "Peacekeeping by attrition: the United Nations in Angola," Journal of Modern African Studies, vol.36, n.º 3, Setembro de 1998.

14 Samakuva foi hospitalizado durante um curto período de tempo. A Human Rights Watch visionou uma gravação em vídeo do assalto. Dada a forma de operar da UNITA, grandemente autoritária, é provável que este assalto tenha sido premeditado, e um dos erros significativos do processo de paz foi o facto de não ter sido feito qualquer esforço para processar formalmente os assaltantes; esta situação demonstra que a ONU estava preparada para ignorar as violações dos direitos humanos, mesmo quando se tratava de assaltos a oficiais superiores, registados em filme.

15 Human Rights Watch, Human Rights Watch World Report 1999 (Nova Iorque: Human Rights Watch, 1998).

16 ONU, Documento S/1998/931, 8 de Outubro de 1998.

17 ONU, Documento S/1998/1110, 23 de Novembro de 1998.

18 ONU, Documento S/1999/49, 17 de Janeiro de 1999.

19 Entrevista da Human Rights Watch com um funcionário da ONU, 15 de Janeiro de 1999.

20 Jornal de Angola (Luanda), 30 de Janeiro de 1999.

21 Economist (Londres), 24 de Abril de 1999.

22 Agência France-Presse, 22 de Outubro de 1999.

23 `Actualização n.º 99/03 das actividades da Cruz Vermelha Internacional em Angola, 22 de Junho de 1999.

24 Público (Lisboa), 25 de Julho de 1999; Agence France-Presse, 28 de Julho de 1999.

25 Agência noticiosa de Xinhua, 3 de Maio de 1999.

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